(PODCAST) Nómadas digitais no Algarve em modo «projeto-piloto» e com os olhos postos no Interior

Agosto 29, 2023

A ideia de criar uma plataforma para atrair nómadas digitais para o Interior do Algarve e Alentejo começou a ganhar corpo na cabeça de Fábio Jesuíno. Natural do Alentejo, possuiu sempre uma inquietação grande que vem do «saber de experiência feito» de quem nasce num lugar em contínuo despovoamento.

Com uma longa experiência de empreendedorismo na área da criação de websites, que começou há cerca de 20 anos no concelho de Mértola, Baixo Alentejo, Fábio mudou-se a páginas tantas para o Algarve e é a partir do Interior desta região que leva agora a cabo um projeto-piloto que tem tudo para navegar [digital e fisicamente falando!] em plena Eurorregião Alentejo, Algarve e Andaluzia. Sim, porque até já foi contactado por agentes políticos da Andaluzia, Espanha, e que se mostraram interessados em importar o modelo de empreendedorismo da equipa da plataforma digital que promete fazer o que estiver ao seu alcance pelo combate ao despovoamento do Interior. Caso avance poderá ser um motor de fuxo de mais pessoas dentro deste território transfronteiriço e sob o pretexto de uma área de desenvolvimento económico em franco crescimento. O primeiro ano está a ser determinante para que a Rural Digital Nomads seja testada na prática e faça a «prova dos nove» com a teoria há muito fundamentada no papel. Nem um ano ainda se passou e, fruto da divulgação do projeto, tem despertado a curiosidade na região e além-fronteiras. Para já, está a sedimentar-se no interior do concelho algarvio de Loulé [ Alte, Ameixial, Benafim, Querença, Salir e Tôr], apostando na inovação e sustentabilidade do modelo de negócio. No total são já cerca de 40 as pessoas nómadas digitais a aderir a este projeto e a residir em aldeias e em montes de forma ecológica, desde portugueses a estrangeiros. A maior problemática para a qual estão a tentar encontrar respostas tem que ver, invariavelmente, com a habitação para os nómadas digitais. Conheça as soluções encontradas pela equipa da plataforma [oiça a entrevista na íntegra a Fábio Jesuíno, abaixo].

Nómadas digitais procuram as paisagens e a qualidade de vida do Interior

Alte, Ameixial, Benafim, Querença, Salir e Tôr são as freguesias para onde migram os nómadas digitais. Foto de Bernardo Lúcio – Photography

“Os nómadas digitais são profissionais que trabalham online, desfrutando de horários e locais de trabalho flexíveis. Com a liberdade de poderem estar em qualquer parte do mundo, desde que exista uma boa ligação à internet”. E tal como acrescenta a equipa da plataforma Rural Digital Nomads os “nómadas digitais estão cada vez mais à procura de locais que ofereçam um estilo de vida mais sustentável, com contato próximo à natureza, além de um padrão de vida confortável e acessível”. Para trazer nómadas digitais para o interior, é fundamental “implementar uma estratégia focada na melhoria das condições das telecomunicações, garantindo cobertura de internet de alta velocidade, oferecer espaços de trabalho adequados e melhorar as acessibilidades na região. É também extremamente importante promover o território do interior, destacando a sua beleza natural, tradições, cultura e atividades locais, tornando-o uma opção atrativa para aqueles que procuram um estilo de vida sustentável”. A equipa liderada por Fábio J. tem a sua estratégia desenhada e a ser implementada no concelho de Loulé, sendo que já nasceram no Interior do concelho três espaços de coworking [espaços de trabalho partilhados]. O potencial do Interior é grande “com paisagens magníficas, comunidades acolhedoras e uma qualidade de vida invejável, essas áreas possuem um potencial incrível para atrair nómadas digitais”, promove a plataforma no seu sítio da Internet.

Atrair novos e incentivar a que originários não abandonem

No Interior do território não precisamos apenas de pessoas novas a ocupar o seu lugar, mas sim de fixar as pessoas de sempre que lá resistem e, assim, combater o êxodo que se nos afigura quase imparável; como se de uma fatalidade se tratasse. É também [e muito] com esse propósito que foi imaginada esta plataforma para nómadas digitais migrarem para o Interior. “Há muita falta de conhecimento sobre as terras do Interior e o seu potencial”. Fábio J. acredita que o paradigma pode mudar se houver uma ação concertada no mesmo sentido em direção aos territórios deprimidos. O caminho tem tudo para ser atrair nómadas digitais, preparando o território para as suas necessidades sem o desvirtuar, pelo contrário, valorizando o seu potencial. O fenómeno de despovoamento não facilita o processo porque representa diversas lacunas ao nível da oferta no mercado de produtos e serviços, mas se houver uma real e harmónica conexão entre a comunidade existente e as novas pessoas que vão habitar os lugares estamos a falar de sustentabilidade e de futuro. A equipa da plataforma tem a convicão que “os nómadas digitais no interior vão contribuir significativamente para o desenvolvimento económico sustentável, uma oportunidade única de transformação e de combate à desertificação”.

Fábio Jesuíno é natural do Alentejo e o combate ao despovoamento do Interior é uma das suas causas enquanto empreendedor social

Uma das componentes do projeto é divulgar a comunidade onde se insere não só aos potenciais novos habitantes, mas também às outras comunidades próximas de modo a fazer ecoar em rede o que se melhor tem cada lugar e quem o ocupa. “Falamos de tradições, romarias, festas e ofícios que estão a ser revitalizados e outros que [ainda] não se perderam e que é preciso divulgar”. Para Fábio Jesuíno a plataforma de que é autor à boleia do conceito de captação de novos residentes para o Interior estará a levar a cabo um trabalho de valorização do lugar que gostaria que contribuísse para a reversão do indíce de despovoamento. “Poderá caber-nos o papel de relações públicas do Interior, e porque não!?”, assume. Não restam dúvidas que o importante é chamar a atenção para os lugares remotos onde a história já é contada por poucas pessoas. Fazer lobby por esta causa traz todo o sentido à vida de Fábio que não só acredita piamente no potencial do Interior como afiança que é uma missão sua, e que assume enquanto empreendedor social que quer contribuir com a sua quota-parte para o bom desenvolvimento do território.

Jovens desempregados do Interior também já apelam para que plataforma facilite a encontrar trabalho remoto

Está disponível na plataforma digital uma seção de ofertas de emprego remoto para os residentes desempregados no Interior que podem, assim, ter novas oportunidades de trabalho sem abandonar o território

Fábio J. garante que ao longo da divulgação do projeto tem sido contactado por muitos jovens desempregados que vivem no Interior do concelho de Loulé e que, ao darem-se conta da existência da Rural Digital Nomads, apelaram para que a plataforma sirva também como um espaço de facilitação para divulgar a oferta de trabalho digital. No site já existe um separador dedicado a esta oferta. “Esse é um processo que estamos a desenvolver e que acreditamos que pode ser importante para combater o abandono. Os jovens no Interior do território podem nos dias de hoje trabalhar em ambiente digital, ou seja, nas suas casas ou em espaços de coworking para empresas que estão no Canadá, Estados Unidos e tantas partes do mundo! Há muitas ofertas de trabalho a esse nível e essa também pode ser uma via para combater o êxodo”.

Aos poucos, e com a chegada dos migrantes digitais, estão a surgir novas dinâmicas de vizinhança que em tudo se mostram intergeracionais e interculturais. “Há uma grande curiosidade em conhecer a cultura local por parte de quem chega e quem cá está, devidamente informado, recebe com interesse e com o espírito acolhedor que nos caracteriza”. A plataforma faz a ponte entre todos e todas e tenta ajudar para que as várias carências sejam supridas. No website da plataforma existe a seção de Diretório onde estão compilados vários serviços como alojamento e restaurantes que são divulgados aos nómadas que procuram este Interior para se fixarem temporariamente.

Quanto a parceiros desta iniciativa são vários, desde ” as autarquias [câmara municipal de Loulé e juntas de freguesia neste concelho], cooperativa QRER [onde Fábio Jesuíno incubou este projeto] e outras entidades locais que têm sido essenciais para o arranque do projeto”. O trabalho em rede é essencial para aumentar a escala e o impacto de um projeto a este nível. Fábio Jesuíno admite que é ainda visível um certo conservadorismo em determinados municípios com quem tem contactado, nomeadamente no Algarve, que não conseguiram ainda dar o salto para além dos seus muros de modo a passarem a trabalhar em parceria com os seus vizinhos. Este projeto-piloto representa um cartão de apresentação de inovação e o seu mentor acredita que fará o seu caminho e quebrará os muros erguidos o que tornará possível imaginar um Interior algarvio mais desenvolvido e interrelacionado.

Oiça a entrevista a Fábio Jesuíno na íntegra:


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